
O Brasil vive uma mutação institucional silenciosa. Não é mais o Executivo que ameaça a democracia — é o Judiciário, com sua caneta sem freios e sua vaidade inquestionável.
Nos ensinaram que liberdade de expressão é um dos pilares da democracia. Mas no Brasil de hoje, essa liberdade virou privilégio seletivo — concedido por ministros, não por leis. Não há mais dúvidas: vivemos um tempo em que o Supremo Tribunal Federal, sob o pretexto de combater a desinformação, se tornou o maior censor do país.
A Suprema Corte — especialmente na figura de Alexandre de Moraes — tem extrapolado os limites constitucionais, instaurando inquéritos de ofício, censurando parlamentares eleitos, jornalistas, plataformas digitais e qualquer voz dissonante que ouse desafiar a narrativa oficial. Já não se trata de proteger o Estado de Direito — trata-se de proteger o poder contra qualquer ameaça à sua hegemonia.
O mais recente capítulo dessa escalada foi a investida contra o X (antigo Twitter), com decisões exigindo remoção de perfis, bloqueios internacionais e punições financeiras sem sequer permitir contraditório. O problema não está no enfrentamento de crimes digitais — mas no modelo arbitrário, onde o juiz é vítima, investigador e julgador ao mesmo tempo.
Em nome da “democracia”, o STF age como um poder acima dos outros dois. O Legislativo se acovardou, o Executivo se omite — e o povo assiste, perplexo, à instalação de uma nova forma de autoritarismo: o da toga ativista, que se recusa a ser criticada, contrariada ou fiscalizada.
Essa é a censura mais perigosa: aquela que vem disfarçada de virtude, com verniz técnico e escudo jurídico. Não se proíbe mais livros, mas se calham perfis, contas e opiniões. Não se prende por pensar, mas por “desinformar” — conceito tão vago quanto conveniente.
E tudo isso se consolida com o silêncio cúmplice de parte da imprensa e a passividade vergonhosa do Congresso Nacional. Os representantes do povo, com raríssimas exceções, preferem o conforto das emendas e a paz das nomeações ao enfrentamento com o poder togado. Não querem defender o povo — querem preservar o próprio mandato.
O Brasil precisa urgentemente debater os limites do Judiciário. Nenhum poder pode ser absoluto. O STF, em sua função original, deveria ser guardião da Constituição, não seu intérprete exclusivo e dono da verdade.
A liberdade de expressão, por mais incômoda que seja, é a fronteira final antes da tirania. Se aceitarmos que ela seja modulada por ministros — mesmo que em nome de causas aparentemente nobres — abriremos as portas para o silêncio oficial. E onde a verdade não pode ser dita, reina apenas o medo.
Não há democracia sem liberdade de dizer o que se pensa. E não há futuro digno para um país onde criticar o poder virou crime.