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Domingo, 27 de julho de 2025

Ministro da Economia Paulo Guedes explica causas da inflação no Brasil

Ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que a alta dos preços é algo generalizado em todo o mundo

15 de out 2021 - 10h:19 Créditos: Sputnik Brasil
Crédito: Assessoria

Na terça-feira (12), o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que a alta dos preços é algo generalizado em todo o mundo, declarando que a subida dos preços dos alimentos e energia é "culpada" por 50% da inflação.

Para compreender as justificativas de Paulo Guedes, bem como as perspectivas relacionadas à inflação, possíveis consequências na corrida eleitoral e medidas que o país pode utilizar para conter a inflação, a Sputnik Brasil conversou com o cientista político e professor da ESPM-SP Paulo Niccoli Ramirez.

De acordo com o professor, o argumento utilizado por Guedes sobre a alimentação seria válido se o Brasil fosse um país que precisasse de importações para abastecer sua população em termos de alimentação, contudo, o Brasil é, por exemplo, autossuficiente em carne bovina, aves, bem como na produção de cereais.

"Ainda que faltassem produtos no mercado, e caso fossem necessárias as importações, a elevação dos preços no Brasil deveria ser menor do que em comparação ao resto do mundo", explica.

Isso mostra que o mercado brasileiro de produção tem os valores muito voláteis de acordo com os preços de exportações, ou seja, que são taxados pelo mercado internacional.

É um erro esse tipo de afirmação do Paulo Guedes, pois nós aplicamos políticas de variação de preços, mesmo de energia e alimentos, que seguem uma organização baseada em países que são importadores. Na verdade, o Brasil é produtor. Então, isso mostra algumas incoerências, e muitas vezes falta de conhecimento de que a realidade dos fatos é que os valores no Brasil são estipulados de acordo com interesses comerciais e não com a necessidade de abastecer a população", explica.

Paulo Niccoli Ramirez também ressalta que o Brasil é autossuficiente na produção de petróleo, mas por uma opção a Petrobras não alcança esse patamar, ou seja, é uma opção política, importando combustível, e o Brasil, mesmo tendo uma produção interna considerável de combustível, acaba aplicando políticas que são de países que não possuem produção petrolífera, fazendo com que o combustível brasileiro fique exposto às variações e oscilações do mercado internacional.

Brasil vai acompanhar previsão de inflação alta até o fim de 2021?

Segundo Paulo Niccoli Ramirez, por conta da situação pós-pandemia, quando a economia começa a se equilibrar, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) a altos índices, a inflação também cresce devido ao aumento do consumo.

Contudo, isso não acontece no Brasil, onde há um crescimento vertical da inflação, que foi o maior desde a invenção do Plano Real, mas ao mesmo tempo que a inflação aumenta de forma vertical o PIB não cresce.

"A previsão de crescimento do PIB do Brasil para 2022 está em 1,9%, ou seja, muito pouco em consideração ao crescimento da inflação", ressaltou.

Dados do Censo poderiam prejudicar a corrida eleitoral de 2022?

Anteriormente, o governo brasileiro alegou corte nos gastos e que não haveria recursos suficientes para realizar o Censo, algo que custaria em torno de entre dois e quatro bilhões de reais.

"É um argumento contraditório à medida que a gente observa que o próprio governo distribuiu cargos e recursos para seus apoiadores dentro do parlamento e que superam muito mais o valor do Censo", ressaltou.

De acordo com o professor, havia um grande interesse de Bolsonaro em não realizar o Censo durante o seu governo, porque haveria dois modelos econômicos distintos seguidos pelo Brasil, um deles do governo Lula, que investia em projetos sociais, período em que a miséria foi consideravelmente reduzida, e do governo Temer e Bolsonaro, que cortam os gastos sociais, com um financiamento menor na educação, na saúde, além da piora na alimentação e alta da inflação.

"Os dados [do Censo] que seriam apresentados, seriam infinitamente piores do que aqueles dos últimos Censos. E o resultado desta história seria um grande prejuízo à própria imagem de Bolsonaro", enfatizou.

Paulo Niccoli Ramirez observa que houve cortes no orçamento do Censo, e muitas das questões que deveriam ser feitas foram descartadas do Censo para economizar, "dados que poderiam revelar problemas em acesso à educação, aos portadores de necessidades especiais, saúde pública, aos meios de transporte".

"O questionário teria de ser reduzido para economizar recursos, e é óbvio que quando você reduz a quantidade de questões e dados, você também acaba produzindo uma fraqueza por parte das autoridades públicas na percepção de onde estão os problemas da sociedade e onde investir recursos para resolver estes problemas", explicou.

Venda de ações da Petrobras

Comentando a declaração do ministro Guedes, onde ele defendeu a venda de ações da Petrobras para combater a pobreza, Paulo Niccoli Ramirez afirmou que "na prática significa uma postura neoliberal".

O professor recordou que o ministro Guedes quer adotar a política de privatizações, e que ele já havia prometido privatizar tudo que fosse possível, como os Correios, o Banco do Brasil e, atualmente, a Petrobras.

"Não podemos esquecer que esse tipo de postura resolveria o problema do Brasil momentaneamente, e seria mais vantajoso a longo prazo que a Petrobras mantivesse anonimamente o sistema atual ou o anterior, quando era totalmente estatal, quando os recursos eram obtidos a partir da retirada de petróleo para os cofres públicos, e a partir dos cofres públicos atender os interesses da sociedade", observou.

Para o professor, Paulo Guedes dá uma justificativa temporária e provisória, especialmente porque no Brasil as privatizações são feitas a custos muito baixos para o mercado, bem como a venda de ações.

"Isso vai ilustrando o interesse de Paulo Guedes em atender os interesses do mercado, e não necessariamente da população brasileira", enfatiza.

Auxílio Brasil pode solucionar problema da inflação?

O governo Bolsonaro deve lançar em novembro o Auxílio Brasil, um programa social substituto da Bolsa Família e o aumentar de R$ 190 para R$ 300 mensais.

Contudo, para o professor, devido à inflação a medida é uma troca de "seis por meia dúzia" do ponto de vista da capacidade de consumo da população.

"Numericamente isso chama atenção do eleitorado, ou seja, pular de R$ 190 para R$ 300, e pode ser uma tentativa de o Bolsonaro atrair a população mais carente para seu eleitorado como apoio político, mas tudo vai depender do que vai acontecer no próximo ano, nos próximos meses, em relação à inflação", declara.

Paulo Niccoli Ramirez ressalta que é fundamental que o governo Bolsonaro tenha como uma de suas políticas o controle da inflação, pois isso piora as condições de consumo da população mais carente.

Aprovação do texto-base do ICMS para tentar reduzir preço do combustível

A Câmara dos Deputados aprovou, na quarta-feira (13), o texto-base do projeto de lei complementar PLP 11/2020, que institui uma nova metodologia para a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços pelos estados e Distrito Federal.

Ao ampliar o período de referência, os defensores da medida afirmam que seria possível reduzir a volatilidade nos preços cobrados nos postos.

Por sua vez, Paulo Niccoli Ramirez afirma que a grande estratégia de Bolsonaro em relação ao aumento do combustível é "colocar a culpa nos governadores", exatamente para a cobrança do ICMS, "que permite uma espécie de concorrência fiscal dentro do Brasil", com cada estado cobrando um valor específico, contudo, há um projeto na Câmara para padronizar o valor do ICMS.

"O Bolsonaro acaba colocando a culpa nesse imposto cobrado pelos governadores, quando na verdade o imposto é uma porcentagem sobre o valor da produção, que é política de governo [...] Mesmo que o imposto seja padronizado em todos os estados, cedo ou tarde o valor do combustível vai continuar aumentando [...] o preço do combustível no Brasil está sujeito às variações do mercado internacional", ressalta.

Caso de Pandora Papers

Depois que o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos divulgou, no último domingo (3), o relatório Pandora Papers sobre alegado envolvimento de alguns líderes mundiais, funcionários públicos e artistas em esquemas de offshore, inclusive o ministro da Economia e o presidente do Banco Central do Brasil, o procurador-geral da República, Augusto Aras, falou que não se pode fazer investigações com base em notícias.

Porém, logo depois Aras acabou abrindo, na segunda-feira (4), uma investigação preliminar sobre os investimentos no exterior dessas figuras. Paulo Guedes é proprietário de uma empresa offshore nas Ilhas Virgens Britânicas que em 2015 contava com US$ 9,55 milhões – mais de R$ 52 milhões no câmbio de hoje. Contudo, o ministro Guedes afirma "não ter feito nada de errado".

Para Paulo Niccoli Ramirez, é óbvio que o ministro Guedes se desresponsabilize, contudo, ao mesmo tempo ele teve um lucro considerável com a desvalorização do preço do real, mostrando que essa offshore tem interesses no processo de aumento dos combustíveis e na desvalorização do real.

"É um efeito em cadeia, em que o Paulo Guedes, representante dos investidores, tem interesse. Um investidor ganha muito mais com a desvalorização da moeda", observou.

Apesar de o governo tentar reduzir a taxa de juros, em um cenário de crise e baixo crescimento do país "reduzir a taxa de juros é a porta aberta para o aumento da inflação", pois o investidor vai ganhar de duas formas, ou com a taxa de juros elevada ou com uma inflação elevada.

"Ganhou muito com isso o Paulo Guedes, por mais que ele diga que não e que não tenha nada a ver com isso, houve um implemento de pelo menos quase R$ 30 milhões na conta dele, simplesmente porque a moeda se desvalorizou, e isso precisa ser justificado", concluiu.


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