O caso da menina Raíssa, de 11 anos, violentada sexualmente e morta em Dourados no fim de semana é o retrato de uma combinação que tem deixado rastro de destruição em muitas famílias: miséria e drogas. Na Reserva Indígena da cidade não tem sido diferente. "É preciso que as autoridades tomem alguma atitude, essas questões sociais não podem ficar sobre os ombros das lideranças", diz o capitão Gaudêncio Benites, de 41 anos.
Ele acompanhou de perto o caso e diz que ficou surpreso ao saber que o crime também teria sido praticado pelo tio da vítima e que os abusos aconteciam desde quando a criança tinha 6 anos. Primeiramente havia a suspeita que quatro menores tinham praticado o abuso, mas depois foi descoberta a participação do tio de 34 anos e de um homem de 20.
Na qual, Raíssa ainda foi atirada de um paredão de aproximadamente 20 metros. No local do crime, na aldeia Bororó, há uma pedreira desativada, utilizada com frequência para uso de álcool e drogas. "É preciso encontrar uma forma de pôr um fim nas questões ilícitas que ocorrem há muitos anos em nossa Reserva. Estamos abandonados", disse Gaudêncio Benites.
A aldeia Bororó tem aproximadamente 8 mil moradores e a Jaguapiru, ao lado, cerca de 10 mil. As duas são urbanas e localizadas entre Dourados e Itaporã, no entanto, bem mais próximas a Dourados. "Todo mundo sabe que aqui [Reserva] entra de tudo e não há fiscalização. Temos vários comércios de venda de bebida alcoólica e crianças e jovens fazem compra", relatou a liderança.
Sendo comum ver pessoas consumindo bebida, período que se inicia os registros de violência, seja doméstico ou de brigas em toda a Reserva. Os fatos se estendem até domingo. Grande parte dos crimes ocorrem com o uso de arma branca (faca, facão), mas já houve registros de homicídios por arma de fogo.
O caso de Raíssa é tratado pela liderança indígena como complexo, pois várias pessoas da família fazem o uso de bebida. "Tem várias assim e é difícil trabalhar. Até pra gente como liderança, pois corremos risco, sofremos ameaça quando chamamos a polícia. E o trabalho é voluntário", descreve o capitão.
Ainda antes da pandemia houve uma reunião entre órgãos lidados a comunidade indígena, como Funai, Ministério Público Federal, Sesai, além de Procon, forças de segurança, entre outras entidades governamentais. Gaudêncio disse que chegou a discutir uma saída para os problemas relacionados ao álcool e drogas, contudo, não avançou as discussões. Enquanto isso, a comunidade indígena de Dourados continua desamparada, sem condições básicas mínimas, como rede de água. Com população maior que quase metade dos municípios de Mato Grosso do Sul, os problemas do dia a dia são os mesmos (conhecido por qualquer autoridade), mas todos sem solução.