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Domingo, 27 de julho de 2025

Avanço do HIV no Brasil pode gerar epidemia silenciosa, alerta estudo

Pesquisa feita no Rio Grande do Sul indica que casos de HIV estão 64% acima do limite que a OMS define para casos tolerados.

17 de jul 2025 - 09h:41 Créditos: Metrópoles
Crédito: Divulgação

Um novo estudo feito na Região Metropolitana de Porto Alegre (RS) revela que a prevalência de pessoas detectadas com o HIV ultrapassou os limites da Organização Mundial da Saúde (OMS) em 64%.

O número acendeu um alerta sobre o risco de uma epidemia silenciosa desta e de outras infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) estar se desenrolando no país. Não é novidade que as infecções por HIV no Brasil têm crescido. Os dados mais recentes publicados — com informações de 2021, 2022 e 2023 — mostram que os novos casos da doença subiram levemente.

Estes dados, no entanto, são compilados a partir da população que busca atendimento de saúde, o que pode levar à subnotificação de casos. Uma grande parcela da população pode estar com a doença se desenvolvendo de forma silenciosa em níveis ainda maiores.

No estudo divulgado pelo Hospital Moinhos de Vento, a metodologia foi outra: os pesquisadores testaram ativamente uma parcela da população para avaliar a incidência das ISTs. É o primeiro estudo de sorologia realizado em alta escala no Brasil.

No caso do HIV, a taxa de prevalência na população gaúcha foi estimada em 1,64%, acima do limite de 1% estabelecido pela OMS para apontar que a epidemia está controlada. Níveis acima deste indicam epidemia generalizada.

O que é o HIV e sua diferença para a aids?

  • O vírus da imunodeficiência humana (HIV) é um microrganismo que ataca o sistema imunológico. Quando não é tratado, ele pode evoluir para a aids (síndrome da imunodeficiência adquirida), que representa o estágio mais avançado da infecção pelo HIV.
  • Embora não exista a cura para a aids, o tratamento antirretroviral pode controlar a infecção, permitindo que pessoas vivendo com HIV tenham uma vida longa e saudável.
  • O tratamento correto pode fazer com que o paciente atinja a carga viral indetectável para o HIV, ou seja, tão baixa que não pode ser detectada por testes padrão. Nesse caso, a pessoa também não transmite o vírus.
  • O HIV é transmitido principalmente através de fluidos corporais específicos, durante o sexo sem proteção, compartilhamento de seringas e de mãe para filho durante o parto, quando não for bem assistido.
  • Beijos, suor, ou qualquer outra forma de contato íntimo, incluindo o sexo feito com preservativo, não transmite o HIV.
  • O SUS disponibiliza testes rápidos para o HIV e também o tratamento preventivo com a profilaxia pré-exposição (PrEP), com o uso de um remédio diário. Procure um serviço de saúde e informe-se para saber se você tem indicação para PrEP.

Epidemia ganha contornos silenciosos

A pesquisa testou 8.006 pessoas. Foram confirmados 81 casos de HIV, 558 de sífilis, 26 de hepatite B e 56 de hepatite C. Embora a testagem tenha se concentrado no Rio Grande do Sul, os pesquisadores consideram os resultados um sinal de alerta nacional.

O estudo foi conduzido pela médica epidemiologista Eliana Wendland, do Hospital Moinhos de Vento. Ela destaca que a taxa alta de prevalência é um sinal de alerta para este inimigo silencioso.

“Estes dados mostram que estamos diante de uma epidemia generalizada. Quando olhamos para quem tem maior probabilidade de contrair o vírus, esse risco está mais associado a determinadas vulnerabilidades sociais. Estamos falando, por exemplo, de pessoas negras ou pardas, com menor renda e escolaridade, e que geralmente estão na faixa dos 30 aos 59 anos”, afirma.

Números oficiais do HIV apontam tendência

Entre 2007 e 2024, foram notificados mais de 540 mil casos de pessoas com HIV no Brasil. A maioria (70%) dos infectados são homens.

O HIV pode permanecer anos no organismo sem causar sintomas. Sem diagnóstico, o vírus continua a ser transmitido, dificultando o controle. A infecção compromete o sistema imunológico e pode evoluir para aids, condição que deixa o corpo vulnerável a infecções e cânceres.

Quando identificado precocemente, o HIV é controlável com o uso contínuo de antirretrovirais que impedem a progressão para a aids. Quando a carga viral chega a níveis indetectáveis, não há risco de transmissão.

“O estigma é um dos principais entraves ao diagnóstico. Muitas pessoas evitam buscar testagem por medo ou vergonha. Isso dificulta o acesso ao tratamento e mantém a cadeia de infecção ativa, especialmente entre grupos mais vulneráveis”, alerta Wendland.

Sífilis também avança

Além do HIV, o estudo trouxe resultados sobre a sífilis, que também preocupa as autoridades de saúde. A estimativa é de que sete em cada 100 brasileiros tenham a infecção, que pode ser curada com três aplicações de penicilina benzatina. Muitas vezes, o diagnóstico não é feito a tempo, o que leva à necessidade de tratamentos ainda mais intensos.

A infecção pode permanecer assintomática por anos. “A primeira manifestação pode parecer inofensiva, como uma ferida que some sozinha. Sem tratamento, evolui para estágios mais graves, como a sífilis terciária, com potencial de afetar órgãos internos e o sistema nervoso”, afirma a autora do estudo.

Entre gestantes, o risco é ainda maior. A sífilis congênita pode causar aborto, sequelas ou morte neonatal. O Brasil já registrou mais de 3 mil óbitos desde 1998 por esse motivo. O Rio Grande do Sul tem uma das maiores taxas em gestantes do país: 41,1 casos por mil nascidos vivos, atrás apenas do Rio de Janeiro e Amapá.

Ministério da Saúde se esquiva

O cenário apresentado pela pesquisa feita no Rio Grande do Sul, sobre os riscos de uma epidemia, levantam dúvidas sobre o estado da questão no restante do país. Procurado pelo Metrópoles, o Ministério da Saúde foi perguntado sobre a prevalência da doença em outros estados do país, mas não respondeu aos questionamentos.

A nota enviada pela pasta detalha apenas as boas ações neste sentido, incluindo o recente pedido de certificação de fim da transmissão vertical do HIV (de mãe para o bebê) e do número de pessoas que consegue tratamento após o diagnóstico (96%, taxa acima dos 95% recomendados pela OMS).

“Cabe ainda destacar que as ações da pasta são voltadas à população em geral, com foco ampliado em populações-chave — como gays e outros homens que fazem sexo com homens (HSH), pessoas trans, profissionais do sexo e usuários de álcool e outras drogas — onde a prevalência é consideravelmente maior”, defendeu.

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