O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve decidir nesta semana, segundo auxiliares, sobre uma eventual volta do horário de verão.
A medida foi colocada na mesa de discussões do governo em razão da seca recorde pela qual passa o país e a chegada do período do calor mais intenso na maior parte do território nacional.
A seca diminui o nível dos reservatórios das hidrelétricas, maior fonte da energia elétrica no país. O calor aumenta o uso de eletrodomésticos como o ar-condicionado e, consequentemente, aumenta o consumo de energia.
O horário de verão foi extinto em 2019, primeiro ano do governo Jair Bolsonaro. Na época, o governo alegou que a economia de energia era baixa e não justificava a adoção da medida.
O horário de verão consiste em, nos meses do verão — quando faz mais calor e os dias têm luz natural por mais tempo — adiantar o relógio em uma hora. Assim, quando as pessoas chegam em casa após o trabalho e começam a ligar aparelhos, não precisam ligar também as lâmpadas elétricas, o que diminui um pouco a demanda. O acionamento da iluminação urbana também passa para mais tarde, aliviando a carga.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e o Operador Nacional do Sistema (ONS) vão apresentar nos próximos dias um estudo sobre o horário de verão nas atuais circunstâncias.
A decisão final caberá a Lula, e será uma decisão não só técnica, mas também política, já que o horário de verão mexe com a rotina da sociedade.
Veja abaixo prós e contras segundo especialistas:
Contras
Pouca economia de energia
Os especialistas são unânimes em dizer que o horário de verão economiza, ao longo do período, pouca energia elétrica.
Cláudio Sales, presidente do Instituto Acende BR — observatório do setor elétrico no Brasil — estima que a economia chega a apenas 0,5%.
Isso porque, segundo ele, os hábitos da população mudaram ao longo das últimas décadas e, hoje, aparelhos de ar-condicionado e ventiladores ficam ligados praticamente o dia inteiro quando faz calor, e o pico do uso de energia é no meio da tarde, e não mais no início da noite, período que poderia ter influência do horário de verão.
"Antigamente, o pico máximo de consumo ocorria no final do dia. Hoje, ocorre no meio do dia, e o horário de verão não interfere nisso", afirmou.
O professor Luciano Duque, mestre em Energia Elétrica, ressalta que as cargas dos aparelhos para refrescar o ambiente são muito maiores que a do chuveiro elétrico e a da iluminação, por exemplo.
"Nós estamos num período de calor intenso, onde as cargas mais utilizadas são ar-condicionado, condicionadores de ar, ventiladores. Essas cargas consomem bastante energia durante o período de verão, muito mais que a iluminação, até mesmo mais que o chuveiro", explicou o especialista.
Impacto nos ciclos biológicos da população
Especialistas também lembram que há um impacto nos ciclos biológicos da população. Com o relógio adiantado em uma hora, não só anoitece mais tarde, como também demora um pouco mais para amanhecer, em relação ao horário normal.
Assim, principalmente os trabalhadores que acordam cedo, poderão sair de casa ainda no escuro, ao contrário do que acontece regularmente. Além de afetar a saúde de algumas dessas pessoas, a mudança representa também um risco à segurança, já que a rua, no escuro, tende a ser menos segura.
"A implementação do horário de verão, acredito que não vá economizar energia o suficiente. E, sim, vai trazer um transtorno à população. Vai ter um transtorno aí, de adaptação de horário. Vai ter a questão de saúde também nas primeiras semanas", argumentou o professor Duque.
Prós
Ajuda ao sistema em horário crítico
Apesar de, no acumulado total, o horário de verão economizar pouca energia, a medida ajuda o sistema elétrico nacional em um momento crítico: o início da noite.
Isso porque, quando anoitece, algumas usinas que compõem o sistema do país junto com as hidrelétricas — como as eólicas e as solares — geram menos energia. A solar, porque a luz do sol decai. A eólica, porque os ventos diminuem.
Nesse contexto, o horário de verão pode dar uma pequena ajuda e um alívio ao sistema elétrico. Porque, com o horário de verão, a hora de ligar as luzes passa um pouco para mais tarde, e não coincide com a hora da chegada em casa (quando vários aparelhos são ligados ao mesmo tempo).
"No fim do dia, ainda há uma pequena influência [do horário de verão]. No momento em que a geração solar, que é cada vez mais relevante, começa a cair, entram em ação fontes de energia flexíveis, como hidrelétricas e termelétricas, para atender à demanda", explicou Sales, do Acende BR.
"Esse acionamento de usinas ocorre em uma 'rampa' para suprir o pico de consumo no final do dia. Mesmo que a influência do horário de verão seja pequena, ela ajuda a atenuar essa rampa, reduzindo um pouco a necessidade de esforço das usinas", completou.
Sales lembrou que, nessas horas, a alternativa é ligar as termelétricas, mais caras e mais poluentes. Portanto, quanto menos termelétricas forem ligadas, melhor.
Setor de bares e restaurantes
Para o setor de bares e restaurantes, o horário de verão é uma maneira de dinamizar suas atividades.
O entendimento é de que as pessoas saem do trabalho e sentem que ainda está cedo e que o momento é propício para um happy hour ou para um jantar. O setor lamenta a extinção do horário de verão desde 2019.
Além disso, defensores do horário especial argumentam que a iluminação natural na volta para casa dá maior sensação de segurança e as cidades se tornam mais pulsantes.
Com as pessoas ficando mais tempo nas ruas, há impactos positivos no trânsito, nos transportes públicos e na segurança pública, segundo essa visão.
Histórico do horário de verão
No Brasil, o horário de verão foi instituído durante a gestão de Getúlio Vargas, em 1931 e 1932, mas só passou a ser adotado sem interrupções a partir de 1985, com o fim da ditadura militar. Ao longo do tempo, ocorreram alterações sobre os estados e as regiões que o adotaram.
No mundo, o horário diferenciado é adotado por dezenas de países, mas é mais comum em países fora da região tropical. Ele é adotado em países como Canadá, Austrália, Groelândia, México, Nova Zelândia, Chile, Paraguai e Uruguai.