Após paralisação do transporte público, que ontem deixou mais de 100 mil pessoas sem locomoção, os vereadores de Campo Grande voltaram a pressionar a Mesa Diretora para que o pedido de abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) protocolado em fevereiro deste ano seja aprovado.
Ao Correio do Estado, o vereador Marcos Tabosa (PDT) disse que o intuito é fazer uma varredura no contrato da prefeitura com o Consórcio Guaicurus, concessionária responsável pelo serviço na Capital.
“Precisamos saber quem está errado nessa história. É a prefeitura? É o consórcio? Precisamos ver nome por nome dos funcionários, saber o porquê de a situação dos ônibus ser essa, tudo em más condições, velho, lotado. Será que estamos diante de um caso como o da Seleta e o da Omep?”, questionou.
O vereador se referiu ao escândalo envolvendo a Organização Mundial para Educação Pré-Escolar (Omep) e a Sociedade Caritativa e Humanitária (Seleta), mantidas com dinheiro público e usadas como cabide de emprego de políticos e empresários, além de desvios de verba que resultaram em operação do Grupo de Atuação de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) em dezembro de 2016.
Segundo Tabosa, até o momento, nenhum dos 13 vereadores que assinaram o pedido de CPI voltou atrás.
“Só falta mesmo passar pela Mesa Diretora”. O presidente da Casa de Leis é o vereador Carlão Borges (PSB), que faz parte da base aliada do Executivo, comandado por Marquinhos Trad (PSD) até abril deste ano e agora sob gestão da prefeita Adriane Lopes (Patriota).
Durante discussão sobre o assunto na sessão ordinária desta terça, embora tenha garantido não ser contrário à apuração, Carlão disse que CPIs nunca dão resultado: “Sempre acabam em pizza”.
Para ele, o ideal é encontrar outra saída para a questão, mas não detalhou bem o que seria.
Tabosa diz que, com o colega de parlamento Tiago Vargas (PSD), vai continuar debruçado em desenrolar a apuração. Vargas, por sua vez, também se pronunciou. Para ele, de fato há um prejuízo milionário mensalmente, mas somente por meio de uma CPI é possível desvendar “a caixa-preta” do Consórcio Guaicurus e mostrar à população de Campo Grande os números reais.
“Eu acho que a hora é essa. Vamos abrir essa caixa-preta desse consórcio e colocar o dedo na ferida. O que eu vejo é o seguinte: são muitos empresários, e até políticos, quem sabe, com medo de o Consórcio Guaicurus abrir sua caixa-preta”. Propositor da CPI que teve pedido protocolado em fevereiro, professor André Luis (Rede) segue a mesma linha de raciocínio.
“Estamos em um ponto agora em que é irreversível a abertura da CPI. Nós precisamos resolver esse problema do transporte coletivo de Campo Grande, que não pode ser tratado da maneira que está sendo tratado”.
O parlamentar ressaltou que os constantes reajustes no preço do diesel abrem desproporção na planilha de custos do serviço e acabam onerando a empresa. “Então, o transporte público é caro, sim. E o poder público tem que arcar com parte desse custo”.
ENTENDA
Desde agosto do ano passado, vereadores querem instaurar a CPI do Transporte Público para esmiuçar o contrato de concessão, que está em vigência desde 2012.
Conforme o pedido já protocolado, a investigação leva em conta as reclamações dos usuários, a frota defasada para atender todos os que precisam, a falta de manutenção e precariedade dos carros e, em contrapartida, o valor alto da tarifa, hoje em R$ 4,40.
Para dar início à comissão, são necessárias 10 assinaturas de vereadores, ou seja, um terço dos 29 parlamentares.
Em fevereiro deste ano, os vereadores aprovaram, por 26 votos a 1, dois projetos que deram isenção e remissão do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) ao Consórcio Guaicurus, além de aporte de R$ 1 milhão por mês durante todo este ano.
SAIBA
Problemas relacionados ao transporte coletivo em Campo Grande são motivos de uma série de ações judiciais, multas e procedimentos administrativos. São pelo menos 78 processos em que o Consórcio Guaicurus figura como réu, apenas na primeira instância.
Além dos casos judicializados, o Consórcio também ficou na mira de órgãos de controle por desrespeitar os termos que regem a concessão do transporte coletivo na Capital.
Em 2019, por exemplo, o Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul (TCE-MS) realizou uma inspeção e constatou uma série de improbidades que culminaram na assinatura de um Termo de Ajustamento de Gestão (TAG).